quarta-feira, 10 de abril de 2013

                                         A DAMA DE FERRO


“baby, hoje cê faz treze anos, vejo em seus olhos seus planos”... quando os anos 80 começaram, eu tinha a mesma idade da baby que o Raul cantou...  no mesmo disco, antológico, visionário, já se sabia o que seria aquela década... “ei anos 80, charrete que perdeu o condutor”... só não sabíamos ainda que Raulzito não chegaria aos anos 90... e naquele ano, 1980, perderíamos John Lennon (ah, estrela amiga, por que você não fez a bala parar?)... não só o pop/rock perdeu dois gênios, o mundo perdeu duas pessoas que pensavam além dos paradigmas do ter e fazer.

Ainda em 80 o rock perderia seu maior baterista, John Bonham, e com ele o final da banda que fez a transição entre o rhythm blues e o heavy metal, para muitos a maior banda de rock de todos os tempos, o Led Zeppelin.

Para compensar tantas perdas, foi em 1980 que surgiu a Donzela de Ferro, ou Iron Maiden, que conquistaria o mundo principalmente a partir de seu terceiro disco, The Number of the Beast, com Bruce Dickinson assumindo os vocais. O nome da banda foi inspirado em um instrumento medieval de tortura, consistido de um sarcófago antropomorfo com pregos em seu interior, que, ao fechar-se a porta, penetravam no corpo da vítima. Registre-se que o Iron Maiden, destarte suas letras, caveiras e visual agressivo, tinha em seus integrantes pessoas “caretas”, muito profissionais, motivo inclusive da saída de Paul Di’anno, pois o vocalista original fazia a linha sexo, drogas, muita droga, com rock’n roll.

Se no rock britânico havia a Donzela de Ferro, a política estava entregue, desde 79, à Dama de Ferro, alcunha da primeira-ministra Margareth Thatcher. A inspiração do apelido da premier é o mesmo aparelho de tortura que ficou famoso em Nuremberg.

Nos anos 80 houve a amálgama de cria e criador, Inglaterra e Estados Unidos. Aqui não se pondera quem criou quem, tamanha foi a afinidade entre Thatcher e Reagan. Com a economia mundial em colapso, após a crise do petróleo, essa entidade, Reagan/Thatcher optou por confrontar as políticas econômicas keynesianas, implantando o modelo que estava sendo incubado no Chile sanguinário de Pinochet.

As privatizações em massa, o poder dado ao mercado, à redução do estado, medidas que em conjunto ficaram conhecidas como neoliberalismo, pretendiam que cada individuo fosse em si um capitalista, a ser engolido pelas estruturas capitalistas cada vez maiores. Thatcher promoveu a ilusão de que a privatização resolve qualquer problema e que a desregulação do sistema financeiro favorece as economias. Esta desregulação promovida por Thatcher pode ser apontada como uma das origens da crise mundial iniciada em 2008. "Nove em dez economistas atribuem à desregulação um papel potencializador da crise que se abateu sobre o mundo”, diz um professor da Unicamp.

Essa constatação, por si, já deveria servir para ruir o mito desta senhora, mas a macroeconomia é uma área hermética, insensível, e dessa forma não de vê, nem se lê, nem se comenta, que o neoliberalismo foi o responsável, nos anos 80,  por milhões de mortes de crianças, jovens, adultos, idosos, homens, mulheres, brancos, pretos, vermelhos, amarelos, que tinham em comum o fato de viverem no terceiro mundo e serem pobres. Foram mortes por fome, pela violência de regimes totalitários, guerras fratricidas,  epidemias, e a mais terrível das mortes, ainda mais temível que a dama de ferro, a morte por falta de esperança.

Aos 87 anos, morreu a senhora Margareth Thatcher, sobreviveu aos anos 80, o mundo sobrevive a ela, mas àqueles que morreram nesta década são como as boas e velhas bandas de rock’n roll, jamais voltarão. É em memória desses velhos companheiros do mundo que hoje na vitrola vou ouvir Led Zeppelin, e Iron Maiden, e Raul Seixas, e pensar: que pena que ela morreu hoje, e não antes dos anos 80.
 
Carlos Moraes

5 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  2. Sarcástico, ácido e inquietante tudo que se gosta de ler num texto produzido a duas mãos e muita sagacidade.
    Adorei as pitadas de rock para açucarar o assunto indigesto da Sra. Thatcher.
    Super xeros.
    Compartilhadíssimo - poetas escrevem para serem degustados, assim seja!
    Maria Lourenço

    ResponderExcluir
  3. Não entendo quase nada de politica , muito menos de poesia mas adoro ler e sinto o teor das palavras...mas nesse assunto o que sei é que Margareth Thatcher foi a maior e mais forte mulher que o mundo já viu.

    ResponderExcluir
  4. Maravilha de crônica...não dá para fugir de tudo de bom que a música dos anos 80 nos deu e nos levou...
    Ideologia..eu quero uma para viver!!!(Cazuza)já nos mostrava isso e tens toda razão quando diz : mas àqueles que morreram nesta década são como as boas e velhas bandas de rock’n roll, jamais voltarão.

    Estamos cada vez mais sem referências,esse é meu maior medo!!!
    E vamos lá ouvir Led Zeppelin...

    ResponderExcluir
  5. 14/04/2013 16h27 - Por AFP
    Londres festeja morte da Dama de Ferro

    Centenas de manifestantes se reuniram em Londres, na Inglaterra, para protestar contra o legado de Margaret Thatcher, que morreu aos 87 anos no último dia 8. Uma música da trilha-sonora do filme "O Mágico de Oz" que fala "a bruxa está morta" tornou-se uma espécie de grito de guerra contra a Dama de Ferro.

    David Douglas, ex-mineiro e membro da União Nacional de Mineiros de Yorkshire, disse que ficou muito contente ao saber da morte da ex-premiê.

    "Foi uma mulher horrível e estamos furioso com a imagem da imprensa de que todos neste país estão de luto", denunciou.


    Fonte: Uol Noticias

    ResponderExcluir